Quando surgiram os rumores sobre o Palmeiras ter interesse em contratar Felipe Melo, eu sabia que ele era um bom jogador, experiente, mas como não acompanhava seus jogos na Internazionale, fiquei meio indiferente à suposta contratação. No entanto, por causa de um episódio ocorrido há alguns anos, eu já tinha alguma simpatia por ele. Numa ocasião em que ele foi atacado/desrespeitado pelo ‘apresentador’ Neto – como o ‘apresentador’ faz muitas vezes, achando que estar à frente de um programa esportivo é o mesmo que ter permissão para desrespeitar pessoas, clubes – eu, por acaso, li a resposta do Felipe Melo pra ele… e adorei.
E começaram os recadinhos – indiretos – dele no twitter, no Instagram, fotos e frases que sugeriam que ele estaria vindo para as Perdizes sim… e começamos a nos divertir com ele, a esperar por ele…
E o Pitbull chegou… falando grosso, falando forte, prometendo respeitar o clube que ia “colocar comida na mesa de sua família”, prometendo honrar a camisa do Palmeiras sempre, mesmo que isso significasse “dar tapa na cara de uruguaio” na Libertadores. Claro que isso foi um exagero por parte dele, foi uma declaração desnecessária e imprudente, mas também foi apenas maneira de dizer; dada a fama de valentes e brigões dos uruguaios, seria o suprassumo da dificuldade ter coragem de dar um tapa na cara de um deles. Felipe Melo queria demonstrar assim que seria capaz de qualquer coisa para defender as cores do seu novo clube. Era só isso.
A imprensinha – ressentida porque ele preferira o Palmeiras a um certo clube carioca, e já o espinafrando desde então – aproveitou, deu a conotação que quis à declaração, fez de tudo para a declaração chegar com as piores cores no Uruguai, e ele entrou no olho do furacão – às vezes, ele se complica sozinho mesmo. É intenso, exagerado, difícil, fala o que vem na cabeça e se esquece das outras interpretações que suas declarações podem ter e das consequências que elas podem trazer. E todo mundo sabe o final da história… ele acabou dando porrada em uruguaio mesmo… merecidamente, aliás – o Peñarol é useiro e vezeiro em querer bater nos adversários quando é derrotado, e fez o de sempre com o Palmeiras. E, além da surra na bola, da virada espetacular do Verdão, um jogador deles – que corria atrás de Felipe Melo para agredi-lo -, levou uma porrada, de verdade, com ‘ousadura e responsabilidade’.
Ainda que Felipe Melo extrapole em algumas declarações, ainda que para alguns (pra mim) ele pareça inconsequente e meio desajustado às vezes – há quem diga que ele é só marketeiro -, ainda que seja uma bomba prestes a explodir, ele ganhou a torcida.
Mas o Pitbull não ganhou a torcida só por isso. Ganhou a torcida jogando bem, sendo considerado em muitas partidas um dos melhores em campo… sendo raçudo, sempre querendo vencer, e honrando a camisa. Mesmo com a nossa desclassificação no Paulistão, os números dele foram interessantes… o melhor desarme do time, o jogador palmeirense que mais fez lançamentos certos, 92,1% de aproveitamento nos passes…
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E, ao contrário do que a imprensa tanto alardeara desde que ele optara pelo Palmeiras, o “Tiranossauro Rex”, “vilão”, “desleal”, não era tão vilão e tão faltoso como diziam, não era desleal, como garantiram que ele seria. Esses números foram publicados em Abril/2017:
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Em Maio, ele era o jogador com maior número de desarmes no time do Palmeiras…
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(Esses números são injustos com Thiago Santos – ele desarma mais que chuveiro no inverno -, porque ele ficava no banco de reservas muitas vezes, assim como são injustos com Felipe Melo os números de Setembro, uma vez que o Pitbull está sem jogar há um bom tempo)
As notícias também diziam que Felipe Melo treinava sério, era um dos últimos a sair dos treinos, que era um atleta muito profissional e, por isso, por ter jogado 12 anos na Europa, por ter defendido a seleção e continuar se esforçando nos treinos como se fosse alguém em começo de carreira, servia de exemplo para os mais jovens e menos experientes do elenco.
Na volta de Cuca ao comando do Verdão, Pitbull foi para o banco… Primeiro, foi contra a Chape, na segunda rodada do Brasileiro, mas, na ocasião, Cuca tinha resolvido levar um time todo alternativo para Chapecó (não deu certo o time alternativo e perdemos o jogo). Depois, contra o Galo, no Allianz, com o time todo titular, o Pitbull ficou no banco (não fizemos uma boa partida, e empatamos em 0 x 0).
Confesso que não entendi o critério adotado pelo nosso técnico, ainda mais quando ele alegou que Felipe Melo era lento (sim, ele é mais lento mesmo) e Thiago Santos sabia sair jogando melhor – isso não corresponde à realidade, TS desarma muito, mas não é tão eficiente na saída de bola quanto Felipe Melo. Gosto muito dos dois, mas Felipe Melo vinha bem no time, fazia boas partidas, e eu não entendia porque ele tinha sido sacado – do campeonato e não de algumas partidas -, sem mais nem menos (em 2016, Thiago Santos também virou banco tão logo Cuca assumiu o Palmeiras).
A torcida chiava com o banco para FM, a imprensa especulava… e veio uma declaração do Cuca mais ou menos assim: “Ele (Felipe Melo) é um funcionário do Palmeiras, quando for necessário, será utilizado”.
Eu achei que as entrelinhas dessa declaração seca, sem nenhuma gentileza, não pareciam muito legais, achei que faltou o costumeiro “ele é um grande jogador, ajuda o time, é importante, mas em algumas oportunidades, por questões táticas, vou montar a equipe diferente”… aquelas coisas que todo técnico diz por cuidado, para não melindrar um jogador mais experiente e não perder o grupo. Achei , começava a se formar uma bola de neve aí… achei que era a senha para o jogador, costumeiramente falastrão, falar alguma bobagem…
Mas, depois de uns dias, parecia que Felipe Melo aceitava o banco de boa… Prass disse em uma entrevista que o comportamento do Pitbull, mesmo na reserva, era bastante profissional; Keno também disse o mesmo…
Felipe Melo se lesionou e, quando voltou, foi poupado em algumas partidas importantes (contra COR, FLA)… Estava na cara que o técnico não o queria no time. E estava na cara também que isso ia ter desdobramentos ruins.
Não sei como e nem porque a diretoria não foi capaz de antever e evitar… técnico experiente, badalado, e atleta experiente, contratação badalada da temporada, em rota de colisão (os dois deveriam ter sido “chamados na chincha” para darem um jeito de conviver e trabalhar em proveito do clube)…
E não deu outra, tão logo a imprensa (toda ela) publicou que Cuca reunira o grupo para dizer que Felipe Melo não estava em seus planos, não se encaixava em seu esquema (chato para um jogador ser ‘dispensado’, via imprensa, seja ele quem for; não é legal que essas informações vazem. Mattos disse que Cuca não fez isso, mas ninguém do Palmeiras desmentiu quando a notícia foi publicada em vários portais, com imagens, inclusive). E tão logo a notícia ganhou os veículos de comunicação, não demorou muito e surgiu a reação: um áudio de Felipe Melo atacando Cuca.
Deram a corda para Felipe Melo se enforcar, e ele se enforcou totalmente. E quem não sabia que algo do tipo acabaria acontecendo, né? Mas foi deplorável ele ter feito esse áudio e o soltado por aí como quem não queria nada; foi horroroso ele ter dito publicamente o que disse do treinador – goste do treinador ou não, tenha o Cuca fritado ele ou não (eu achei que fritou), tem que respeitar a chefia -, se ele é funcionário do clube, e o clube escolheu o Cuca para ser o “comandante”, ele, e qualquer outro funcionário, tem que respeitá-lo. E, tivesse FM razão ou não de estar na bronca, desrespeitar o treinador e a pessoa por trás do treinador, ainda mais publicamente, está totalmente relacionado com desrespeitar o Palmeiras, desrespeitar os companheiros. Errou muito, e feio, o Felipe Melo… e, claro, perdeu completamente a razão. E nem poderia ser diferente.
Foi um escândalo. O nome do Palmeiras, de maneira bastante negativa, ganhou todas as manchetes… Felipe Melo assumiu a autoria do áudio, alegou que tinha bebido (e isso não é justificativa)… e então, depois da eliminação para o Cruzeiro, as notícias de um “Pitbulll desagregador” apareceram, as notícias de um “elenco que pediu à diretoria o afastamento do jogador” ganharam as mídias sociais, as notícias de “jogadores que perderam a liderança no elenco por causa dele e que, por isso, não andavam jogando bem” surgiram, uma tentativa de agressão ao Egídio e ao Dudu (e eu soube que isso não era verdade) foi noticiada… e o jogador foi afastado, colocado para treinar separado do elenco…
E ponto final.
Ponto final? Ah, tá…
A gente achando que a coisa ia engrenar… mas o Palmeiras (mesmo sem Felipe Melo no time e com ele afastado do elenco) conseguiu a proeza de, jogando muito menos do que gostaríamos que ele jogasse, ser eliminado também na Libertadores pelo fraco Barcelona-Guayaquil, e no Allianz. Não bastasse isso, o time somava 8 derrotas no Brasileirão, já tinha perdido a invencibilidade em sua casa, e praticamente dava adeus à disputa do título (matematicamente as chances existem, mas com 14 pontos atrás do líder, é muito improvável virar esse jogo), e tudo no prazo de um mês… com o agravante de, em pleno Allianz Parque, e logo após a eliminação na Libertadores, perder para a Chapecoense – que voltava de excursão(!!) pela Europa e Ásia (demos uma sacolada no SPFW depois, pra compensar os desgostos).
Felipe Melo, por sua vez, se valendo de direitos trabalhistas, acionou o Palmeiras na justiça…
Uma turbulência imensa e um prejuízo ao Palmeiras, que poderiam e deveriam ter sido evitados (eu acho). E nós ficávamos com a impressão que a coisa não ia ter fim… mas, e sempre tem um mas, depois de todos esses reveses, depois de todo mundo ter que fazer um ‘mea culpa’ a respeito do ano perdido, sabemos lá por quais caminhos, diretoria, técnico e jogador se acertaram, ou se propuseram a se tolerar (quem pode saber?)… e Felipe Melo foi reintegrado ao elenco.
E, na segunda-feira, na coletiva pós reintegração, Felipe Melo, mesmo com uma postura arrogante, reconheceu que errou e disse que isso serviu de aprendizado, admitiu que se retratou com todos, disse que falou para o técnico que não pensa aquelas coisas dele de verdade, ou seja, se desculpou (do jeito torto dele, mas o fez), e voltou a treinar. Cuca, por sua vez, já tinha dito antes que não quer prejudicar o Palmeiras , não quer prejudicar ninguém.
Eu achei bom que ele tenha voltado. Primeiro, pelo Palmeiras, que ia ter problemas legais e financeiros com as consequências desse afastamento. Segundo, pelo futebol do time mesmo. Apesar de faltar humildade a FM nas entrevistas (agora é hora de ele baixar um pouco a bola fora das quatro linhas), são os números que ele tinha quando estava jogando, o comprometimento e a raça que tinha em campo, que interessam. Apesar de todos os pesares e apesares, não penso que ele seja um jogador dispensável do nosso elenco. Ele é um bom jogador, tem qualidade, é inteligente, e isso vem antes do “ser bonzinho”… Bonzinho, humilde, que “não tem boca pra nada”, é o ‘Caramujo’, mas nenhum palmeirense quer ele no time, não é?
No entanto, espero que Felipe Melo saiba medir bem as palavras daqui pra frente, saiba ser mesmo um exemplo para os mais jovens, saiba ser uma pessoa mais fácil de se lidar fora de campo, mais generosa com as demais. Ele vai precisar se policiar em relação às suas atitudes, e se relacionar com o técnico (e com o elenco) da melhor maneira possível – e o técnico com ele.
Se essa volta vai ser boa ou ruim, não sabemos… só o tempo dirá. Vai depender muito da boa vontade e empenho dos dois lados nessa história, vai depender do pulso firme dos dirigentes. Se Felipe Melo vai voltar a ser relacionado, também é outra incógnita.
E não espero outra coisa de Cuca e de Felipe Melo que não seja atitude de homens, como essa que tiveram agora ao acertarem a reintegração mesmo tendo que passar por cima de tantas coisas; não espero outra coisa que não seja o trabalho sério, profissional e em proveito do Palmeiras, tendo como prioridade só o Palmeiras. Palmeiras, que é o único motivo de os dois estarem ali, trabalhando juntos. No futuro, eles não estarão mais aqui, no entanto, tudo de bom que fizerem, que conquistarem no clube, ficarão com o Palmeiras , e com eles também, pra sempre.
Tomara que o tempo suavize as cicatrizes, tomara que o Palmeiras retome o rumo do qual não deveria ter se desviado… tomara que o Pitbull tenha crescido e aprendido mesmo com o que aconteceu, tomara o Cuca acerte o esquema de jogo, tomara amanhã seja muito melhor pra nós todos do que foi nesses últimos meses… tomara o Palmeiras possa estar em paz.
Ao trabalho, Verdão! Nosso ano ainda não acabou… e terminar o campeonato no G4 é ponto de honra pra todos nós.